terça-feira, 12 de agosto de 2014

#3 - QUIZÁS, QUIZÁS, QUIZÁS, Vasco Graça Moura

quando se está com gripe e nos dói toda a cara
o mal-estar só passa imaginando
que mozart uma vez encontrou nat king cole
e pôs-se a acompanhar 
quizás, quizás, quizás

a voz de um era rouca na curva do bolero
e o piano gemendo em graves da mão esquerda
dava a sua resposta a siempre que me preguntas

e triste era o refrão, 
quizás, quizás, quizás.

na música e na vida, algum desesperado,
mesmo sem estar com gripe ia perdendo o tempo,
sombrio, alcoolizado, pelas melancolias
da voz e do piano, 
quizás, quizás, quizás.

nat king cole e mozart, depois de improvisarem,
fumaram um cigarro e foram-se trocando
trauteios, estranhezas, de 
blues e de sonatas,
mas tudo fragmentário, 
quizás, quizás, quizás.

se algum saxofone pegasse nesse tema,
juntando variações azuis e lancinantes,
podíamos ouvir um köchel qualquer coisa

be bop e dissonante, quizás, quizás, quizás.

e voltaria a voz em ritmos sacudidos,
no bar, na discoteca, nas sombras, nas entranhas.
nat king cole a cantar, mozart a acompanhá-lo,
ah, turvos corações, 
quizás, quizás, quizás.

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